Mudanças entre as edições de "Cambuí e o pecado"

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(Os jovens falam muito pouco dele com as suas namoradas)
(Os jovens falam muito pouco dele com as suas namoradas)
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'''9 - Com quem conversa?'''
 
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                                   São Paulo  Rio    Cambuí
 
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  Com esposa (marido)                 21%     11%      25%
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  Com esposa (marido)                 21%     11%      25%
  Com os filhos                       18%     12%      15%
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  Com os filhos                       18%     12%      15%
  Com a noiva (noivo)                   2%     4%      3%
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  Com a noiva (noivo)                 2%       4%      3%
  Com amigos                           27%     25%      38%
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  Com amigos                         27%     25%      38%
  Com colegas de trabalho/estudos     25%     16%      20%
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  Com colegas de trabalho/estudos     25%     16%      20%
  Só com o padre                       1%     1%      2%
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  Só com o padre                       1%       1%      2%
  Com outros membros da família         8%     3%      14%
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  Com outros membros da família       8%       3%      14%
  Outras respostas                     5%     -        -
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  Outras respostas                     5%       -        -
  Não conversa                         50%     59%      43%
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  Não conversa                       50%     59%      43%
 
   ''Observação:'' respostas múltiplas, total superior a 100%.
 
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Edição das 09h37min de 6 de janeiro de 2016

caparealidademaio68.jpg

Revista Realidade, nº 26, maio, 1968, Editora Abril, São Paulo, págs. 139-146.

Como os brasileiros veem o pecado

Trezentos brasileiros — todos católicos, ou pelo menos assim se considerando — , cem de São Paulo, cem da Guanabara e cem da cidade mineira de Cambuí (4 mil habitantes), foram entrevistados. Suas opiniões, atitudes e julgamentos constituem a substância desta pesquisa sobre pecado. Das pessoas ouvidas, 150 homens e 150 mulheres, 182 estão na faixa de 18 a 34 anos de idade; 118 têm 35 anos ou mais. Também 118 são os solteiros; 168 casados; há 9 viúvos e 4 desquitados Fizeram curso primário 136 dos entrevistados; 129 fizeram ginásio e colégio; 28 — dos quais 25 cariocas — chegaram à Universidade. Quatro não sabem ler ou escrever; e três, que sabem, nunca foram à escola. Detalhe importante; os cariocas são de Copacabana, os paulistas de um bairro operário. Os questionários foram aplicados pelo INESE — Instituto de Estudos Sociais e Econômicos. O sociólogo Luiz Weis elaborou a pesquisa e analisou os resultados.

1 — O senhor vai à missa?

     São Paulo   Rio    Cambuí
Sim 	 82%	 76%	  88%
Não  	 18%	 24%	  12%

2 — Com que frequência?

                           São Paulo	Rio    Cambuí
Algumas vezes na semana         3%	 4%	 1%
Todos os domingos              21%	30%	41%
Alguns domingos                23%	18%	27%
Raramente                      35%	24%	19%
Não vai à missa                18%	24%	12%

A frequência de idas a missa ê menor aparentemente sugere a alta porcentagem de respostas sim à pergunta 1. Porque as alternativas da pergunta 2 (algumas vezes por semana, todos os domingos, alguns domingos), de um lado, e raramente, não vai, de outro) mostram que 47% de paulistas e 52% de cariocas comparecem aos ofícios com certa regularidade – e não 88% e 76%. A mesma diferença aparece em Cambuí, onde 60% iriam à missa, e não os 88% da pergunta 1.

3 – Vai à igreja, fora do horário de missas, para rezar sozinho?

            São Paulo    Rio     Cambuí 
Sim           69%        64%      64%
Não           31%        36%      36%

4 — Quando?

                                           São Paulo        Rio       Cambuí
Frequentemente		                      26%	     25%	25%
Sempre que precisa resolver algum problema     8%	      6%	 5%
Raramente		                      35%	     33%	34%
Não vai fora do horário de missa	      31%	     36%	36%

Vai-se mais à missa do que rezar em solidão, principalmente em Cambuí. E, nas três cidades, as mulheres (80%, 82% e 72%), bem mais dos homens (58%, 82% e 56%), preferem ir à igreja nos horários de missa; É baixo o número de fiéis que buscam o templo sempre que precisam resolver algum problema. Dos que vão frequentemente em São Paulo, 34% são mulheres, 18% homens. No Rio, a diferença entre os sexos é de 46% contra apenas 4%. O padrão se repete em Cambuí: 30% mulheres, 20% homens.

5 — Quando se confessou pela última vez?

                               São Paulo   	Rio	Cambuí
Há menos de 6 meses               30%   	23%	  38%
Entre 6 meses e 1 ano             16%	        16%       13%
Entre 1 e 5 anos 	          38%	        36%       27%
Há mais de 5 anos                 25%	        22%	  20%
Não  sabe   	                    - 	        -          -
Nunca se confessou                 1%   	 3%	   1%

A prática da confissão esta mais viva em Cambuí do que em São Paulo e em São Paulo mais do que no Rio. Nessas duas últimas cidades às mulheres se confessam com maior frequência que os homens. Em Cambuí porém, a diferença entre os sexos é menos acentuada Jovens e velhos pouco se distinguem em São Paulo e no município mineiro. Já no Rio, as pessoas com 35 anos ou mais costumam confessar-se mais que os jovens. Entretanto, à medida que a idade avança, a confissão declina: 39% dos mais velhos em São Paulo e Cambuí e 24% no Rio confessaram-se pela última vez há cinco anos ou mais.

6 - "Uma pessoa pode não frequentar a igreja e ser bom bom católico."

                 São Paulo    Rio	Cambuí
Concorda   	    77%       80%	 73%
Discorda            21%       19%        26%
Não sabe             2%        1%         1%

Geralmente, os homens tendem mais que as mulheres a concordar com a frase. Contudo, é mínima a diferença entre ambos os grupos: 4%.

7 – Costuma conversar sobre o tema “pecado”?

          São Paulo      Rio      Cambuí   
Sim          50%         44%        57%
Não          50%         56%        43%

Os jovens falam muito pouco dele com as suas namoradas

8 - Quando?

                  São Paulo   Rio     Cambuí
Frequentemente       11%       9%       10%
De vez em quando     25%      20%       32%
Raramente            14%      12%       15%
Não conversa         50%      59%       43%

As respostas positivas a pergunta 7 perdem força Ao serem confrontadas conjuntos da questão seguinte. De fato, 64% dos paulistas raramente conversam sobre o pecado ou nunca o fazem. Essa porcentagem sobe a 71 no Rio, mas cai bastante em Cambuí: 58.

9 - Com quem conversa?

                                 São Paulo   Rio    Cambuí
Com esposa (marido)                 21%      11%      25%
Com os filhos                       18%      12%      15%
Com a noiva (noivo)                  2%       4%       3%
Com amigos                          27%      25%      38%
Com colegas de trabalho/estudos     25%      16%      20%
Só com o padre                       1%       1%       2%
Com outros membros da família        8%       3%      14%
Outras respostas                     5%       -        -
Não conversa                        50%      59%      43%
  Observação: respostas múltiplas, total superior a 100%.

Em 182 entrevistados, cujas idades variam 18 a 34 anos - faixa em que a proporção dos solteiros é alta - somente 9 concluíram o pecado com o tema de suas conversas com as namoradas ou noivas. Em São Paulo e em Cambuí cabe principalmente o pai levantar o assunto perante os filhos. No Rio, entretanto, o quadro é radicalmente oposto: em 10 entre 12 casos, a iniciativa foi tomada pelas mães.

10 - Por que não costuma conversar sobre o tema pecado?

                               São Paulo  Rio   Cambuí
É assunto ultrapassado             12%    17%      9%
É assunto íntimo                   48%    47%     44% 
Os outros achariam graça            4%     -       -
Os outros não dariam atenção        6%    14%     12%
Não teria a dizer                  32%    19%     33%
Outras respostas                    -      3%      2%

Dos entrevistados com 35 anos ou mais, apenas dois (de São Paulo) mencionaram a alternativa assunto ultrapassado, quantos 18 jovens, entre eles entre eles 10 cariocas. Foram também os moços (13 deles) que se lembraram de indicar que os outros vão dar atenção. Não teria nada a dizer sobre o pecado 23 mulheres 18 homens. A tese de que se trata de assunto íntimo é defendida principalmente pelos homens do Rio e de Cambuí e pelas mulheres de São Paulo.

11 - "Hoje no Brasil as pessoas se preocupam com pecado menos do que deveria". Concorda com essa afirmação?

             São Paulo  Rio   Cambuí
Sim             77%     72%     68%
Não             23%     27%     31%  
Não sabe         -       1%      1%

12 - Por que?

                                  São Paulo   Rio   Cambuí
Falta de educação religiosa          47%      44%     41%
Moralidade baixa                     27%      22%     16%
Influência do comunismo               -        1%      1%
Aumento do saber científico          14%      15%     12%
A nova orientação da Igreja não 
 dá importância ao pecado            12%      15%     21%
Não sabe                              -        -       9%

A opinião de que os católicos brasileiros pouco se preocupam com o pecado é mais difundida entre os grupos dos velhos nas três cidades pesquisadas. No Rio, mais entre as mulheres (80%) do que pensam os homens (64%). Somente duas pessoas - uma carioca de mais de 35 anos e um cambuiense da mesma faixa de idade - apontam como causa a influência do comunismo.

13 - As noções de céu e inferno são:

              São Paulo     Rio     Cambuí
Verdadeiras      66%        55%       60%
Falsas           34%        43%       35%
Não sabe          -          2%        5%

14 - Qual dessas frases está de acordo? Céu e inferno são noções::

                                                             São Paulo   Rio   Cambuí
Falsas, mas ajudam as pessoas simples a aceitarem a religião    11%      20%      6%
Falsas, mas ajudam as crianças a serem bem comportadas          12%       7%     13% 
Falsas e não deveriam ser transmitidas                          11%      16%     16%
Verdadeiras                                                     66%      55%     60%
Não sabe                                                         -        2%      5%

O ceticismo e a dúvida manifestam-se acima de tudo entre os homens de Cambuí 42% dos quase certo que o céu inferno soluções falsas e 8% não se definiram, totalizando assim metade da população católica masculina entrevistada no pequeno município mineiro contra 34% de incrédulos - apesar de considerarem católicos - paulistas e cariocas. Já as mulheres de Cambuí pensam diferente: em cada 10, 7 acreditam que os conceitos são verdadeiros. As cariocas estão divididas: 52% das respostas positivas, 48% negativas. Em São Paulo, bairro operário, são os jovens e não os velhos que mais acreditam no céu e no inferno

15- É pecado?

Em Cambuí, 56% das mulheres (contra 24% dos homem) não votariam em candidatos ateus para não pecar. Só no Rio contar piadas sobre religião deixou de ser considerado pecado pela maioria. O carioca também não vê pecado em emprestar dinheiro a juros altos, pratica mais condenada pelos paulistas e cambuienses, contra a opinião das respectivas populações femininas. Em São Paulo, no Rio e em Cambuí, mais mulheres que homens tendem a associar minissaia a pecado, Posição contrária é a dos jovens, principalmente os cariocas (80%), para os quais minissaia não está associada a sentido pecaminoso. Indepedente da idade, os paulistas e os cariocas são os que em maior número separam pecado da sonegação de impostos, assim como o fazem 7 em cada 10 jovens de Cambuí. Ser a favor do divórcio não é pecado para a maioria. A masturbação é o item que provoca maiores dúvidas, sobre¬tudo entre as mulheres de Cambuí, 44% das quais não souberam responder. Das três populações femininas, aliás, só a de São Paulo não identifica masturbação com pecado. Quanto aos grupos de idade, há uma constante; em todas as amostras, os mais jovens (não é pecado) diferem dos mais velhos (é pecado).

As mulheres estão a favor do controle de natalidade

16 - Há pouco tempo, um médico trocou o coração de um doente, que consentiu na operação. Como católico sente que:

                                          São Paulo        Rio       Cambuí
O médico cometeu um grave pecado              2%            3%         1%
Médico e paciente pecaram                     5%            6%         -
Só o paciente pecou, porque consentiu         5%            -          1%
Não houve pecado, porque o paciente parou     5%            4%         5%
Não houve pecado                             80%           85%        86%
Não sabe                                      3%            2%         7%

17 - Comete pecado o casal que evita filhos por métodos não aprovado pela Igreja?

                                           São Paulo        Rio       Cambuí

18 - O pecado é cometido:

                                           São Paulo        Rio       Cambuí

19 - O casal comete pecado ainda que não tenha meios de sustentar os filhos?


                                            São Paulo        Rio       Cambuí

20 - Deve a Igreja permitir que os casais evitem filhos usando métodos até agora ela condena?

              São Paulo    Rio     Cambuí
Sim             18%        18%       26%
Não             35%        30%       41%
Não sabe         -          3%        3%
Não há pecado   47%        49%       30%

21 - Quando diz que evitar filhos é pecado, a Igreja está:

              São Paulo   Rio      Cambuí
Certa           44%       40%        56%
Errada          56%       58%        42%
Não sabe         -         2%         2%

Quando surge a questão do controle da natalidade, a incerteza dá o tom geral às respostas, principalmente em São Paulo e no Rio. Em São Paulo, a diferença de opinião entre homem e mulheres é grande; na proporção de 62 contra 32, são elas que não veem pecado em evitar filhos por métodos não aprovados pela Igreja. O mesmo se dá no Rio, embora seja menor o índice de divergência entre os sexos: 56% de mulheres e 42% dos homens, Em Cambuí, onde as respostas são mais homogêneas, ainda assim são as mulheres as primeiras a achar que o emprego de anticoncepcionais não é pecado; 34% delas assim opinaram contra 26% dos votos masculinos. Os cambuienses mudam de parecer quando se fala de dificuldades econômicas, nesse caso — responderam 52% dos homens — não existe pecado. Quanto ao que a Igreja deve fazer (pergunta 20), em todas as cidades as mulheres, mais que os homens assumem posição reformista. Além disso, reagrupando-se os dados, conclui-se que o grupo conservador (o casal comete pecado e a Igreja não deve mudar) é minoritário. O outro grupo (o casal não comete pecado e a Igreja deve mudar) soma 65% em São Paulo, 67% no Rio e 56% em Cambuí.

Para a maioria a ciência ajuda o homem a ser mais religioso

22 - Um filme que ataca ou ridiculariza a religião católica deve ser:

                          São Paulo     Rio       Cambuí
Proibido                    65%         37%        56%
Permitido para maiores      23%         52%        39%
Permitido para todos         9%          7%         3%
Não sabe                     3%          3%         -
Outras respostas             -           1%         1%

23 - Devem os pais católicos permitir que os filhos menores leiam livros anticatólicos?

          São Paulo     Rio       Cambuí
Sim         22%         24%         10%
Não         76%         76%         90%
Não sabe     2%          -           -

No caso do filme,o que faz a média geral do Rio não acompanhar as outras é principalmente a opinião dos mais moços, dos quais apenas 28% recomendariam proibição integral.

24 - Pode a ciência ajudar o católico a saber o que é pecado e o que não é?

          São Paulo     Rio       Cambuí
Sim          76%        62%         83%
Não          23%        38%         15%
Não sabe      2%         -           2%

25 - A ciência afasta as pessoas da religião?

          São Paulo     Rio       Cambuí
Sim          26%        27%         32%
Não          73%        73%         66%
Não sabe      1%         -           2%

A mulher paulista é a que menos confia na ajuda da ciência, ao passo que, entre os homens, os entrevistados de Cambuí foram os que manifestaram maior índice de confiança. E são as mulheres desse mesma cidade mineira as que mais temem uma influência negativa da ciência sobre a religião.

26 - Com qual destas frases concorda? A mulher que se prostitui:

                                              São Paulo       Rio        Cambuí
É pecadora única e responsável pelo pecado       44%          19%          52%
É pecadora, mas não a única responsável          26%          47%          16%
Não é pecadora se foi obrigada à prostituição    14%          28%          22%
Não é pecadora se contribui para a Igreja        14%           6%           6%
Não é pecadora em circunstância alguma            1%           -            1%
Não sabe                                          1%           -            3%

Sem distinção de cidade, as mulheres foram menos tolerantes que os homens: na proporção de 44% contra 32%, julgaram a prostituta pecadora e única responsável pelo pecado. E só dois votos, masculinos, apareceram em toda pesquisa para absolver a prostituta de qualquer pecado. Já a ideia de que a prostituta não é a única responsável por seus pecados foi defendida principalmente pelos cariocas de 18 a 24 anos, os quais, em maioria absoluta (53%), preferiam essa alternativa a qualquer das outras.

27 - Qual destas frases acha certa? A mulher que mantém relações sexuais pré-matrimoniais:

                                                 São Paulo   Rio   Cambuí
Comete pecado se busca apenas o prazer               9%       9%      9%
Comete pecado em qualquer hipótese                  40%      30%     54%
Não comete pecado se pretende casar com o homem     15%      23%     10%
Não comete pecado se os dois se amam                36%      36%     27%
Não sabe                                             -        2%      -

As relações sexuais pré-matrimoniais foram vistas como pecado sobretudo pelas mulheres de Cambuí (76%). Nas três cidades, as opiniões masculinas e femininas divergem: os homens tendem ema maior número a absolver a mulher. Em São Paulo e no Rio, os pontos de vista dos jovens distribuem-se largamente pelos diversas alternativas. Em Cambuí, porém, a metade deles opta pelo item comete pecado em qualquer hipótese.

28 - Qual destes pecados ofendem mais a Deus?

                 São Paulo     Rio     Cambuí
Inveja              41%        30%       23%
Orgulho             24%        21%       42%
Avareza             16%        17%        5%
Preguiça             7%         3%        2%
Luxúria              5%        15%        7%
Gula                 -          -         2%
Ira                  5%        13%        9%
Todos são iguais     -          1%        9%
Não sabe             2%         -         1%

Evidentemente, esta é uma pergunta projetiva: ao serem solicitado a nomear entre os sete pecados capitais aquele que mais ofende a Deus, os entrevistados exprimiram seus próprios sentimentos ante sete modos de agir igualmente condenáveis, segundo a religião. Desse modo, o que dirigiu as opiniões foi a maior ou menor adesão das pessoas aos valores do catolicismo, e sim a moral social.

Os resultados são interessantes: a ira, a gula, a luxaria e a preguiça somam todas juntas, 68 referencias em 300 entrevistados — ou seja, apenas 22% dos inquiridos lembraram de citar um desses pecados. Em todas as cidades, a inveja e o orgulho foram apontados em primeiro lugar; a avareza não interessou muito em Cambuí, mas em São Paulo e na Guanabara, onde a atividade econômica - logo, o dinheiro - desempenha um papel central na vida de todos os dias, deu-se o contrário, o que não é de surpreender.

Da mesma forma, a competição que caracteriza a conduta dos habitantes das metrópoles pode explicar a predominância do pecado inveja que, significativamente, foi mencionado por um total de 41 entre os 100 paulistas ouvidos. Cambuí, por sua vez, deu preferência ao orgulho, o que se deve, possivelmente, à existência de um padrão de contatos sociais menos democrático do que o de cidade grande. Em outras palavras, embora seja reduzido o número de habitantes num município como Cambuí, a distância social entre os poderosos e a cerne simples é comparativamente maior: cada qual tem um lugar definido. Esse fato tende a ser percebido e interpretado pelas pessoas em termos de orgulho e também de inveja: o homem comum queixa-se da atitude orgulhosa dos que estão por cima; estes, por seu turno, julgam que os demais invejam suas posições. Ainda uma observação: é possível que a definição de luxúria não seja conhecida por parte dos inquiridos.

Resumo geral: ele está ligado ao mundo dos nossos dias

A julgar pelos resultados da pesquisa, algo de novo está acontecendo nas relações entre o homem moderno e o pecado. Ou melhor: entre o homem da nossa geração e a imagem que ele faz o pecado. Seria possível dizer a primeira vista que o homem de hoje mostra uma certa tendência a considerar o pecado sem a antiga preocupação. Mas isso nem sempre a verdade. Uma interpretação mais cuidadosa dos números e das porcentagem da pesquisa conduz até à uma imagem diferente e confortadora: a do homem que luta para não quebrar, de repente, a ponte de algo que existe e que sempre existiu entre sua consciência íntima e a fé.

Talvez seja um sistema de valores que representa mudanças em relação ao passado. Os números dao a entender que muitos dos entrevistados deve ter ficado surpresos quando lhes perguntaram se não se interessar política é pecado ou se deixar de pagar imposto é pecado, embora os mesmos entrevistados não estranhassem a presença do item “contar piada sobre religião”. Esta, afinal é uma prova de que nada ou quase nada mudou substancialmente, de que ainda existe uma profunda e reverente tendência a considerar com respeito antigo os assuntos sagrados e os problemas da fé.

A igreja em segundo plano?

Pode se não frequentar a igreja e ser um bom católico, disseram 75% dos entrevistados. Mas a resposta provoca logo após uma reação de geral arrependimento espontâneo: a maioria dos católicos ouvidos faz questão de esclarecer que vai à igreja - para rezar sozinho - também fora dos horários da missa. E sete em cada dez entrevistados buscam no templo e na oração solitária ajuda para os seus problemas.

Parece mais fácil dizer, no primeiro conservação, que o pecado virou assunto sem importância, pois não chega a ser tema frequente de conversas (pergunta 8), sob o principal argumento de que se trata de “assunto íntimo”.

A religião tradicional

A tradição posta em dúvida

Uma redoma para o pecado

Um novo bem: a ciência

Referências:

Revista Realidade, nº 26, maio, 1968, Editora Abril, São Paulo, págs. 139-146.

Biblioteca Nacional, http://memoria.bn.br/DOCREADER/DOCREADER.ASPX?BIB=213659