A menina dos olhos

De Wiki Cambuí
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Sílvia de Freitas Datovo

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Prefácio

Yvone Salles de Oliveira

Sílvia de Freitas Datovo, a Silvinha, como é conhecida, é mineira natural de Machado e cambuiense de alma. Jornalista, amante das artes e da cultura.

Há dezesseis anos encantou-se pela cidade e sua história. Os cambuienses exercem verdadeiro fascínio sobre ela. O que a encanta? A nossa alegria, a capacidade de sonhar e realizar grandes sonhos, a solidariedade de seu povo, a conquista de sua hegemonia social. Saborear as histórias de seu livro é uma satisfação, elas nos invadem a memória, nos trazem de volta ao passado. Com um olhar aguçado da realidade, ela consegue transmitir sentimentos e emoções, em uma linguagem leve e informal. Os relatos são históricos: pertencem a um povo e a um momento da vida desse povo. Contando a história do Clube Literário, consegue entrar em nossas vidas, em nosso passado, onde as imagens aflorarão em nossas mentes, transportando-nos a infância e adolescência. Eis a nossa história, mesclada a tantas outras.

A escolha do nome A Menina dos Olhos segundo a autora, foi devido a representatividade que o Clube Literário exerce sobre as pessoas da cidade. Os sentimentos se misturam: amor, ciúmes,raiva e orgulho, que só as pessoas apaixonadas possuem.

Os vazios, você pode preencher com as suas palavras, a sua história. Porque você é que faz com que cada gesto, palavra, emoção ou presença seja importante, especial e único.

Assim, o livro “A Menina dos Olhos” se torna uma leitura obrigatória para os cambuienses e para quem mais queira penetrar na cultura de um povo guerreiro, honesto e acolhedor.

Que todos que a lerem possam tocar a magia que transforma palavras em imagens, em recordações de tempos felizes.

Clube Literário e Recreativo de Cambuí: 48 anos de História

enina-mulher, já aos 48 anos, nunca teve dono. Muitos quiseram possuí-la. Ciúmes e intrigas fizeram parte da sua jornada. Caiu muitas vezes, mas como uma equilibrista, conseguiu se manter em pé. Festeira, acolhedora, boêmia, imponente, independente. Fonte de inspiração de poetas e intelectuais, que ao cair da noite nela buscavam refúgio. Envelhecente, já está na maturidade, trazendo consigo muitas cicatrizes de um passado bem vivido. Assim se apresenta a todos, pois a todos eles pertence. Ela é da cidade, é do povo, ela é a Menina dos Olhos de Cambuí.

Ao som do Bolero, da Valsa, Bossa Nova, Jovem Guarda, Tropicália, MPB, Sertanejo, Rock-in-Roll, Axé, a Menina cresceu. Acompanhou todas as fases do crescimento e da tecnologia, sempre tentando evoluir juntamente com a história e como foi longa e conturbada esta história! Marcada por disputas e controvérsias, a Menina soube surgir, imergir da vanguarda, das dificuldades. Em silêncio marcou seus passos - pequenos, porém, indeléveis. Nela surgiram amores, alegrias, amargores.

Quantas vidas, quantos primeiros beijos, quantos primeiros olhares, quantas súplicas, quantas declarações de amor, quantas comemorações amalgamam-se entre suas paredes.

Foram muitas.

Uma história recheada de suspiros, de medos, de silêncio e riso. De som, de abraços, de suor e cerveja. Uma história singular, profunda. Uma história de homens e suas idéias. De pessoas e seus sonhos. De dificuldades.

Uma história que a todos convidamos submergir, buscando rostos e lembranças, pois nós somos essa história.

A pequena Cambuí

Em uma cidade tipicamente mineira, que de tão pequena, poderia ser apenas mais uma no mapa de Minas, sem eira e nem beira. Mas, não foi o que aconteceu, devido à sua força política, social e cultural na década de 50. Cambuí sempre foi o reduto dos artistas, berço de poetas e seresteiros que com suas melodias, aqueciam as noites e os corações de seus moradores.

A praça com suas árvores, seu sino, sua igreja e seus bancos era o ponto de encontro de todos os jovens e sonhadores da cidade. Ali, muitos planos e muitos sonhos foram alimentados. E foi num banco da Praça, entre conversas informais, que surgiu a ideia de se fundar um Clube. Sonho de alguns, privilégio de todos.

Em um cenário multicolorido, mesclado com mil cores e sabores, do mais doce ao mais amargo, em uma terra de contrastes, onde o velho e o novo se misturam. Na qual a religiosidade e a política eram questão de honra; onde a palavra ou, um fio de bigode valia muito mais do que qualquer documento. A fidelidade partidária e a crença faziam dos cambuienses pessoas simples, mas com princípios e opiniões formadas, democraticamente imbatíveis. Cercada de mistérios e contradições, a cidade cresceu. Neste clima de realidade e fantasia, começamos a caminhar no contexto histórico e político da década de 50.


A história começa como num roteiro de cinema, com um cenário de filme do velho-oeste americano, no qual as crenças e a fidelidade partidária refletiam a honra do homem de bem. Por causa da política, da ambição e o jeito arrojado destes mineiros, a cidade que possuía apenas 2.214 habitantes, era privilegiada com 2 cinemas, 2 alto-falantes, 2 jornais, 2 campos de futebol.

Tudo isso se deve à rivalidade política existente à época, entre os botinudos e rabicós, ou seja, da UDN e do PSD. Em dezembro de 1950 a cidade foi invadida por homens montados em seus cavalos. Com laços e machados na mão, foram derrubados todos os postes, gerado um grande caos social.

O medo tomou conta dos habitantes que temiam uma nova rebelião ou até mesmo um conflito armado. A Polícia Federal esteve por três vezes na cidade, mas nunca conseguiu chegar aos líderes. Cambuí ficou no escuro durante anos, onde a lamparina e o lampião a gás, iluminavam as noites da cidade.

Depois de tantos transtornos, de tantas brigas políticas e desavenças, os partidos uniram-se para criar uma obra em prol de todos: o Clube Literário e Recreativo de Cambuí, um local onde Botinudos e Rabicós pudessem lutar pelo mesmo ideal. A partir de um sonho, idealizaram um projeto e buscaram meios para concretizar a obra.

Enfim, o Clube

E assim, no dia 29 de março de1956, no Paço Municipal, reuniram-se os 40 sócios fundadores, tomando posse à 1ª diretoria, tendo como Presidente Antônio Paulino de Abreu e vice-presidente, Geraldo Cypriano de Moraes. No mesmo dia foi criado o 1º Estatuto do Clube e encaminhado um requerimento ao prefeito Álvaro de Morais Navarro, solicitando a doação do antigo Grupo Escolar Dr. Carlos Cavalcanti, localizado na Praça Coronel Justiniano, para a sede do Clube.

No dia 7 de abril de 1956, a Câmara Municipal de Cambuí aprovou a doação do antigo Grupo Escolar Dr Carlos Cavalcanti ao Clube, medindo 25,60 (frente) por 37,30 metros (comprimento), equivalente a 954 metros quadrados. A diretoria comprometeu-se a contribuir com Cr$150.000,00 (cento e cinqüenta mil cruzeiros) como auxílio para a construção da escola em outro local. Feita a permuta, a escola Dr Carlos Cavalcante mudou-se ao lado da Prefeitura e o Clube começou a funcionar no prédio da Escola.

Primeira diretoria

Presidente de Honra: Álvaro de Moraes Navarro Presidente: Antônio Paulino de Abreu Vice-Presidente: Geraldo Cypriano de Morais 1º Secretário: Armando Alves Franco 2º Secretário: Waldomiro Martins Bastos 1º Tesoureiro: Guilherme Fróes de Carvalho 2º Tesoureiro: João Lopes de Souza 1º Orador: Sebastião Meyer 2º Orador: Benedito Carvalho Lopes Procurador: Sebastião Rangel Fanuchi Diretores Sociais: Mário Dias Ribeiro e Sílvio Macedo Bibliotecário: Antônio de Anastácio de Moraes Membros do Conselho Fiscal: Halley Lopes Bello, Josué do Amaral, Benedito Salles.

Sócios Fundadores

1-Agenor Fróes 2-Agnaldo de Freitas 3-Ângelo Bernardo Faccio 4-Antônio Anastácio de Moraes 5-Antônio de Moraes 6-Antônio Paulino de Abreu 7-Benedito de Carvalho 8-Benedito Delfino Machado 9-Benedito Salles 10-Benevenuto de Oliveira 11-Braz Meyer 12-Darvin de Souza 13-Geraldo Cypriano de Moraes 14-Guilherme Fróes de Carvalho 15-Halley Lopes Bello 16-Haroldo Heraldo Magalhães 17- Ivo Edgard Eiras 18-Joäo Batista Lopes Filho 19-João Lopes Lambert 20-João Lopes de Souza 21-João Pereira Borges 22-José Almeida Ribeiro 23-José André de Moraes 24-José Augusto Ramos 25-José Bueno 26-José Francisco do Nascimento 27-Josué do Amaral 28-Lourenço Bueno 29-Luiz Evangelista Rangel Padilha 30-Mário Dias Ribeiro 31-Mário de Mello 32-Murilo Gonçalves Torres 33-Newman Pereira Fanuchi 34-Newton Pereira Fanuchi 35-Nilton Dias Fróes 36-Olímpio Nogueira de Figueiredo 37-Savério Chiaradia 38-Waldomiro Júnior de Souza 39-Waldomiro Martins Bueno 40-Wladimir de Oliveira

Tijolo por tijolo

Tijolo por tijolo, com muito suor e sacrifícios, muitas noites mal dormidas em prol de toda uma sociedade. Este é um retrato fiel da realidade de todas as diretorias, de seus presidentes a fundadores. A história de antes se repete: - é como se estas pessoas estivessem aqui para cumprir uma missão. Abnegados, dedicados ao extremo, muitas vezes deixando de lado a família, o trabalho, para verem crescer a sementinha que os grandes idealizadores plantaram no passado. Com tanto amor e dedicação, só poderiam dar bons frutos! Regada, alimentada e amada, transformou-se na “Menina dos Olhos de Cambuí .”

Através de um empréstimo de $300.000,00 (trezentos mil cruzeiros) junto à Caixa Econômica Federal, tendo como garantia a hipoteca do terreno e do prédio, começaram as reformas. Só o empréstimo não foi o suficiente.

Então, cada sócio fundador contribuiu com a quantia de $5.000,00 (cinco mil cruzeiros). Foi realizada também uma campanha, na qual as pessoas doaram objetos e animais (porcos, vacas, novilhos) que foram vendidos e a renda revertida para as reformas do Clube. Nessa época, todos os esforços eram concentrados nas melhorias do Clube. Na estrada que liga Cambuí ao Córrego do Bom Jesus, perto do lago, existia um heliporto, Hangar Salgado Filho, que por motivo inexplicável foi incendiado, e teve seus tijolos doados para ampliação do Clube. Em 1960 foi feita a primeira rifa de um automóvel Volkswagen.

Em 1980, Dorival César Conte doou ao Clube um terreno de 3000 metros quadrados às margens da Fernão Dias, que em 1983 foi vendido para Benevenuto de Oliveira.

Desde a fundação foram feitas várias rifas, bingos e campanhas, para a conclusão da tão sonhada obra. Em 1989 a Prefeitura Municipal de Cambuí, através de DecretoLei, declara o Clube Literário, instituição sem fins lucrativos, de Utilidade Pública, tendo em vista os relevantes serviços sociais que prestava à comunidade, bem como aos poderes Executivo e Legislativo, quando necessários fossem. Nenhum obstáculo impediu que o Clube desempenhasse o seu papel social, que sempre viu a sociedade como um todo, de uma forma globalizada.

Pensando no enriquecimento do carnaval, apoiou as Escolas de Samba Tamos Aí, Turma do Brinco e Turma do Saco. Nunca se manteve distante quando se fazia necessário contribuir para com a Delegacia, a Santa Casa ou o Asilo. Até mesmo para com os desabrigados das enchentes do sul de Minas, promoveu campanhas para arrecadação de alimentos e roupas.

Ser sócio

Antigamente, tornar-se sócio do Clube Literário era privilégio de poucos. Além do preço, os futuros sócios tinham que ser aprovados pela diretoria. O valor da jóia para sócio contribuinte, em 1956, era de Cr$100,00 (cem cruzeiros) e as mensalidades, de Cr$ 20,00 (vinte cruzeiros). O poder aquisitivo da maioria da população era pequeno. Então era difícil poder entrar no Clube. Alguns jovens sonhavam em tornarem-se sócios, mas a burocracia era grande e o dinheiro era curto. A única solução era poupar. Juntando tostão por tostão, vendendo bens pessoais (como pares de sapatos e bicicletas), guardavam durante meses seus salários, para enfim tornarem-se sócios do Literário, o grande point da época.

O estatuto do Clube sempre foi bem claro na classificação dos sócios. Só seriam remidos os que contribuíssem com a quantia de Cr$ 5.000,00 (cinco mil cruzeiros) à vista. Já os Beneméritos seriam aqueles que fizessem doações acima de Cr$ 10.000,00 (dez mil cruzeiros) ou prestassem serviços relevantes, morais ou materiais, a juízo da Assembléia Geral.